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A Sorte da Raposa

Partilha de emoções, experiências, reflexões ❤

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O chá leva água

19.05.21, Dulce Ruano

Chá preto para que serve, benefícios e contraindicações

Um chá quentinho acabado de fazer é para mim uma pequena tentação. Na quinta onde nasci e cresci o chá fez parte de mim tendo como referência o chá preto que a minha avó fazia todos os dias e tomava ao lanche acompanhado de pão com queijo, salivo-me interiormente com esta memória.

Ela tinha uma chaleira de dois litros que fervia e lhe deitava um pequeno punhado de folhas de chá, vinham esmagadas dentro duma caixa quadrada cor de laranja com uma abertura que encaixava numa fisga da caixa.

 

Depois do chá feito levava para cima da mesa, com o coador enchia as canecas até ao cimo, eram grandes, punha o pão que era guardado dentro duma panela gigante que servia só para o pão, salvo raras excepções também poderia servir para cozer grão ou feijão quando havia muita gente no tempo das colheitas. Depois abria a gaveta dum armário e tirava um prato com um belo queijo, a faca era a mesma para o pão e para o queijo, tinha uma boa lâmina e o cabo de madeira já bastante usado.

 

Sentavamo-nos, temperávamos o chá com uma colher de açúcar amarelo, na altura era o mais barato e preparávmos o pão com o queijo, após todo este planeamento iniciávamos o processo prazeiroso dum delicioso lanche. Começávamos sempre pelo chá que parecia ainda estar em ebulição, chegávamos a boca à borda da caneca e com um ruído de quem sorve algo entre os lábios davamos o primeiro gole que nos queimava a garganta, fechávamos os olhos com o intuito de aguentar a dor, mal passava para o estômago já estávamos de novo a sorver mais um gole e de seguida para mimar a garganta pré queimada mordiscávamos um pouco de pão com queijo, logo de seguida outro gole de chá para não voltar a queimar, era sempre assim.

 

Sabia-me pela vida, aqueles sabores ainda os guardo em mim, a mistura do sabor do chá preto com os do pão e do queijo é algo que ainda sinto em pensamento, guardarei eternamente no meu coração.

 

O chá continua muito presente na minha vida, de manhã, à noite, ao longo do dia, no Verão, no Inverno, no Outono e também na Primavera e ainda às refeições. Aqui há uns anos já quase no final da gravidez do Frank, fomos junto com uns amigos a uma aldeia perto que tinha uma casa tipica, famosa pela proprietária cantar fado, era um espaço rústico, com granito à mostra, tinha uma lareira modesta original da casa, serviam petiscos e uns copos, a luz não era intensa, era uma média luz a recriar os tempos antigos e de parcas condições.

 

Serviram-nos pão, chouriça assada na brasa, queijo, café feito na panela de ferro à lareira com uma brasa lá dentro para assentar as borras e claro, vinho. Esse dia, talvez devido à gravidez andei um pouco enjoada e verdade que fiz algum esforço para sair à noite. Evitei os enchidos e praticamente só comi pão sem nada, para beber pedi um chá.

 

Fomos servidos, o meu chá ficou para o fim mas tinha valido a pena, trouxeram numa caneca enorme de barro tosco e sentia que ainda vinha a escaldar, deixei amornar e achei que aquele chá me ia salvar do enjôo, até que levo a boca às bordas da caneca para sorver aquelas duas primeiras empreitadas como sempre foi hábito, o sabor do chá misturava-se com um paladar estranho do próprio barro, achei que era por estar bastante quente, no entanto à medida que ia bebendo aquele sabor era sempre o mesmo e só parecia que estava a tomar um chá de barro.

No final de beber aquela canecada aproxima-se o empregado à minha beira duma forma um pouco intimista segurando um pequeno pires e com algo em cima, de voz baixinha e ligeiramente trémula diz-me isto: “Peço imensa desculpa, ainda por cima a senhora está grávida, mas é que eu trouxe-lhe a caneca da água a ferver e esqueci-me da saqueta do chá, aqui tem e espero que goste. Bom apetite!”

Hoje o meu rico Frank faz 21 anos  e ao jantar vamos tomar um chá.