Como entrar em casa de forma elegante
Quando viajo em tempos de lazer, sempre que possível tento fazer um levantamento de pontos de interesse, curiosidades, distâncias, gastronomia e recomendações diversas.
Atualmente com a divulgação que existe de tudo onde ir e fazer basta um clique que estamos munidos do que precisamos para as primeiras impressões, depois é preciso ir, fazer e experimentar.
Ao viajar para São Miguel levava, como costume, algumas recomendações e uma delas era a nível de restauração, com a intenção de experimentar todos já que as opiniões eram positivas e de facto a grande maioria delas concordei em absoluto, excelente gastronomia, simpatia no atendimento, bem organizados, pouco tempo de espera e no final de cada refeição sentia-me bastante satisfeita.
Ainda assim, no rebanho há sempre uma ovelha negra e um azar nunca vem só, isto é o que dizem, raramente me assiste em sequência, a diferença é a forma como vemos os resultados dos acontecimentos.
Dos restaurantes que tinha na mira tentei distribui-los pelos vários dias deixando alguma margem para as próprias descobertas e num jantar decidi marcar mais um da lista.
Assim que entrámos fomos acompanhados por um empregado, pedi para ficar junto às vidraças que davam para o mar mas estava tudo reservado, que pena, não sabia a disposição do espaço muito menos que se via o mar do outro lado, ainda tentei… mas…
Sugeriram uma mesa praticamente no centro da sala que logo começou a encher, pouco passava das 18:30h.
Pedimos Polvo à Lagareiro e Cherne.
Que eu saiba o Polvo à Lagareiro é uma receita única que se não for feita de acordo com a sua autenticidade não poderá ser chamada de Polvo à Lagareiro, porém, neste “famoso” restaurante foi servido com batata frita além de que no centro do prato vinha um polvo baby que tinha sido apenas e só cozido em água e sal, nem uma gota de azeite trazia em cima.
Quanto ao cherne vinha num prato de aparência feia e sem sabor, textura grossa e enfartado sem qualquer paladar.
Ambos os pratos vinham ainda carregadinhos de azeitonas que não percebi muito bem a razão daquela quantidade astronómica ademais que eu tenho agonia a tal produto, sinto um “certo nonjo” e que me perdoe quem gosta mas só de olhar para elas fico nauseada, mal sabia eu o que ainda estava para me acontecer.
O ambiente dentro do restaurante era stressante, os empregados corriam por todo o lado e em várias direções o que me deixava tonta com tanta movimentação, alguns empurravam uns carrinhos metálicos para transportar os pratos até que um deles passou rasante junto a mim, abalroou-me ao bater uma roda numa pata da cadeira, estava eu nesse momento a levar uma garfada de comida à boca e de tal forma foi o abanão que a comida cai para cima da mesa e daqui cai para o chão, enfim!
Prestes a terminar a refeição e fartinha mais que farta de ali estar propuseram sobremesa, dissemos que não, obrigado! perguntando também se queríamos café, nesse momento arregalei os olhos expondo as órbitas no tamanho máximo para JM que percebeu logo que ali não queríamos mais nada e pedimos a conta.
A meio da refeição percebi que estava uma mulher no interior do balcão com ares de espalhafatosa, deu para perceber porque falava alto e de forma bastante descontraída, via-se que era mesmo a maneira de ser natural e logo percebi também que tinha ares de atabalhoada o que se verificou quando se aproximou da nossa mesa empilhando os pratos sobre as travessas e ao agarrar no prato onde havia azeitonas e vários caroços espeta com aquilo tudo para cima de mim, logo a mim que, repito e desculpem-me mais uma vez quem gosta mas eu tenho um grande nonjo, mesmo muito.
Por breves instantes fiquei imóvel e sem uma gota de sangue, senti vontade de lhe apertar o pescoço e pisar-lhe os pés, é que pediu desculpas mas a rir, confesso que tive de me controlar aumentando exponencialmente a vontade de sair dali para fora.
A conta foi uma barbaridade, a mais alta que pagámos em relação a todos os restaurantes onde já tínhamos ido e que tão bem fomos servidos, em comida, ambiente e simpatia, ali era tudo mau!
Saí desconsolada, irritada e mal humorada, precisava de caminhar um pouco. Ao chegar à avenida principal da cidade vejo umas barraquinhas a venderem gelados de máquina, pensei que talvez um gelado bem cremoso me pudesse acalmar o ânimo, a menina explica todos os sabores mas com um speed tremendo que fiquei sem perceber nada, olhei para o cartaz e peço um copo com duas bolas de sabor a Caramelo salgado que tanto gosto.
Atravessei a rua para me sentar sobre o muro que dividia para o cais do porto marítimo, poder relaxar e saborear mas assim que atravesso a rua vejo o gelado totalmente derretido a pingar-me os ténis, as calças e pelos braços afora escorria-me até quase aos sovacos, após este aparato espeto com o copo de gelado diretamente no caixote do lixo. Estava lambuzada, melada, ainda mais irritada e o mau humor estava quase a passar a humor negro e mórbido.
Passeámos pela avenida, entrámos numas ruas que não sabíamos onde iam dar e de repente, porque na ilha o tempo funciona assim, cai uma enxurrada de água sem qualquer pré-aviso que não deu tempo a nada, corremos para a entrada duma loja que nos tapava uns centímetros, a chuva ficou por uns dez minutos, a água escorria pelas ruas como se não houvesse amanhã e as minhas calças largas podiam-se torcer de tanta água que apanharam.
Abrandou, fizemos uma corrida pelo labirinto das ruas ao encontro do carro e assim que entrei, descalcei-me, tirei as calças.
Quando chegámos à rua da casa onde estávamos hospedados recusei-me a vestir as calças completamente encharcadas, saio do carro na maior das elegâncias, de blusa branca, carteira ao ombro, ténis cor-de-rosa e cuecas pretas. Meti a chave no portão e entrei normalmente.
Não se trata de azares, trata-se de ter tido uma boa oportunidade para não voltar mais aquele restaurante e de ter tido uma experiência nova de entrar em casa duma forma diferente e elegante.
Nota: Respondo em mensagem privada o nome do restaurante a evitar.