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A Sorte da Raposa

Partilha de emoções, experiências, reflexões ❤

A Sorte da Raposa

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A Diva

27.09.21, Dulce Ruano

 

 

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Diva: sinónimo de divindade, deusa, beleza, estrela, musa inspiradora.

Quando se tem 6 anos acredita-se na super mulher como uma heroína, achamos que tanto rodamos, tanto rodamos para nos transformar nela e a deceção é óbvia, fica-se tão tonta que por momentos parece o boneco sempre em pé, logo a abertura dos olhos é a desilusão total, eu sei porque o fiz muitas vezes até que percebi que os senhores que faziam os filmes nos andavam a enganar redondamente e isto fez-me acordar para a vida, não há super mulher com capa e voa e ataca os vilões protegendo os desfavorecidos, os bons, os honestos.

Foi chocante para mim quando descobri que os super poderes eram um mito e que não havia super mulher verdadeira, era apenas uma personagem, ainda assim, uns anos mais tarde, depois de crescer um pouco percebi que afinal as super mulheres existem, sim, mas as reais, as que lutam para si, para uma Familia, para uma sociedade, para um grupo de amigos, pelas suas crias, estas são as verdadeiras super mulheres.

Quando pequena ia, todos os sábados, com a minha mãe à praça fazer compras, a minha avó tinha lá um lugar para vender os produtos que eram cultivados na nossa quinta, o que mais gostava era de ficar junto dela a observar tudo o que se passava à volta, o regateio dos preços, a simpatia que tinham para com a minha avó e os elogios maravilhosos que deitavam sobre mim.

Havia muita mulher a passar, a parar, a comprar, a regatear, observava-as todas com um olhar voraz de apanhar sensações, conhecimentos, aprendizagem do comportamento do ser humano, fascinava-me o que conseguia reter por observação.

Por entre as centenas de mulheres que por ali passavam todos os sábados surge uma especial para mim, hoje sei que era uma bela rapariga de 21 anos, na altura via-a com idade para ser minha mãe. Alta, bastante elegante, cabelo muito curto, rosto em forma de amêndoa, lábios perfeitos em que o superior tinha uma ligeira inclinação ao meio para o exterior. Uma perfeição de ser humano.

Usava brincos compridos, roupas lindas, diferentes e se tudo era característico naquela musa, havia um pormenor especial que eram os sapatos, ficava atónita com todos os modelos que usava, os saltos tinham no mínimo 10 a 12 cm, eram tão lindos, todos dignos de uma princesa, que mulher tão bonita e os sábados passaram a ser ainda mais importantes ir à praça para ver a musa a passar, devorava-a com o meu olhar e quando ela comprava coisas à minha avó, quase que desmaiava de tanta emoção.

Foi assim durante alguns anos, era uma espécie de super mulher e esta era real, admirava-a mais que a super mulher que voava com uma capa no ecrã da televisão.

A vida foi mudando, a pouco e pouco a minha avó abandonou o lugar de venda, eu cresci, as idas à praça diminuíram e como tudo na vida, as coisas em nós vão passando ainda assim nunca esqueci aquela mulher, ficou dentro de mim de tal maneira que sempre a desejei conhecer mas achava que seria impossível, passaram muitos anos, cheguei a pensar que talvez tivesse ido para outra cidade ou para outro país, não tinha forma de saber.

Um dia, depois de ter ido buscar os meninos à escola, a fazer uma rotunda vejo a minha Diva, contornei a rotunda por quatro vezes, senti-me atrapalhada, queria parar o carro e ir ter com ela mas faltou-me a coragem, no caminho para casa desabafei em lágrimas com os meninos, o mais velho disse que eu deveria ter ido ter com ela mas já estávamos longe do seu alcance. Arrependi-me, sofri por não ter aproveitado aquela oportunidade que poderia ser única.

Talvez uns meses depois deste episódio ou talvez uns 2 ou 3 anos, não me recordo, entrei num hipermercado, mal passo a entrada deparo-me com a Diva. Continuava linda, elegante, discreta, maravilhosa e a primeira coisa que fiz foi olhar para os sapatos, super altos e lindos, ela era toda maravilhosa e dos meus olhos saíram umas estrelinhas douradas de encanto, naquele momento pensei no conselho do Frank quando me disse que devia ter ido ter com ela na rotunda, não hesitei, era de facto a minha grande oportunidade, ainda assim dei algumas voltas em redondo a ganhar coragem até que:

- “Olá, desculpe abordá-la assim sem mais nem menos mas eu explico o motivo e irá compreender”

- “Sim, com certeza”

- “Sabe, desde muito pequena que a conheço e sou sua fã” – neste momento os meus olhos enchem-se de lágrimas e rolam pela cara abaixo, a Diva ficou confusa e como não a queria incomodar limpei-me e passei imediatamente à explicação.

Arrisquei, podia ser uma mulher lindíssima pela sua beleza e forma como vestia e calçava mas  ser uma mulher fria e indiferente apesar que os olhos doces dela nunca me enganaram, descubro uma mulher atenciosa, doce, meiga, com um coração enorme de bondade, que paz, que serenidade transmitia, a minha Diva estava ali á minha frente, a falar para mim, pedi-lhe um abraço e ela deu, claro, ainda meio estonteada mas reconhecemos que eu nada era para ela, não sabia da minha existência e ela era a minha Diva.

Trocámos números de telefone, senti que não a podia perder, poucos dias depois encontrámo-nos numa esplanada, para simbolizar a praça, levei-lhe um saco de abrunhos do meu quintal. ficámos Amigas. Falámos ambas de nós próprias, passaram muitos anos, ela deixou de ser a jovem de 21 anos mas apesar da sua idade atual continua linda, maravilhosa e continua a ser a minha Diva. Ela hoje faz anos e não podia deixar de lhe dar este presente.

Grata Diva por fazer parte da história da minha vida. Admiração profunda.

Nota: a imagem em cima é Linda Carter, que fez a personagem da Super Mulher.