Concerto de Gerações
Entrei no mundo dos grandes concertos em 16 Junho de 1993 no Estádio José Alvalade, hoje a Alvaláxia, estava entre as 60.000 pessoas presentes, o alinhamento parecia pesado: Suicidal Tendencies, The Cult, Metallica, estes últimos no auge do mundo Metálico, na altura não me encaixavam muito bem, andava em fase de mastigação, depois desse grande concerto voltei a vê-los mais umas quantas vezes e a última em Madrid decidi que seria o fim do frenesim pelos Metallica, nada contra, apenas deixaram de me impressionar. A verdade é que quando aceitei este estilo de música percebi que gostava não pela imagem cabeluda e correntes penduradas mas sobretudo pela arte sonora em termos de composição, pois entendia como arte apenas o estilo clássico e passei do apenas gostar para o sentir e interpretar os estados de alma de quem compõe ou de quem o representa.
Assistir a um mega concerto deste calibre não me assustava com os sons estridentes associados à onda pesada, nem tão pouco os vozeirões mais esganiçados, salvo seja, ou riffs das guitarras e dos baixos, o que me deixava insegura era os comportamentos do fanatismo exposto à frente do palco por aqueles que faziam moxe e abriam grandes clareiras numa espécie de ritual do mundo das trevas em que o metal se revia, tinha ideia de que essa espécie de violência se iria propagar por toda a gente e eu não era realmente uma pessoa indicada para tal feito. Fui e confirmei que havia moxe, gente a voar e grandes clareiras porém vi que só ia para essa zona quem estava pré-disposto a levantar vôo.
Além da frente do palco, resto era tudo pacifico, entre as pessoas sentia boas energias a fluir e entendi que era seguro estar num mega concerto mesmo sendo música da pesada o que fez com que fosse o inicio dos muitos concertos e festivais que tenho passado, nunca vi uma cena de discussão muito menos de pancadaria, sempre senti o clima de paz, de amizade e de muita cumplicidade.
Uns anos mais tarde e depois de imensos outros concertos na onda do rock ou hard rock ou na cena do metal, os Rolling Stones vêm a Portugal, curiosamente apesar das várias oportunidades ainda não os tinha visto e decidi que aquele ano não escaparia, estava eufórica porém surge um obstáculo, estava grávida de 8 meses do Duarte. Pedi aconselhamento ao meu obstetra que me disse “Vá, desfrute o que puder e leve a mala que a maternidade fica lá perto”, assim que ele diz isto passou-me pela cabeça a loucura de convidar o Mick Jagger para padrinho. Não foi preciso, o Duarte nasceu quando tinha de ser, um mês depois.
Quando iniciei estas vidas eram tempos bastante diferentes, faziamos uma má gestão do dinheiro e andávamos sempre com os trocos contados pelo que a dificuldade em comprar os bilhetes era mais dificil porém um dos maiores problemas que tinhamos de enfrentar eram os nossos pais que tal como eu da primeira vez, achava que não vinhamos de lá vivos. Hoje está tudo virado ao contrário, se naquele tempo era um problema os pais deixarem ir, hoje é um problema para os filhos irem.
Cultivei ao longo destes últimos tempos uma contemplação pela banda dos iron Maiden, diz-se que é a maior à escala planetária, não sei se é mas isso não me interessa, têm a minha admiração pelo trabalho que têm feito, não só sonoro como cénico. A minha homenagem ao épico Bruce Dickinson que além de ser o vocal de um das maiores bandas do mundo, é ainda Empreendedor, Ator, Argumentista, Escritor, Radialista, Palestrante, Esgrimista e Piloto de Aeronaves. É também capitão honorário da força aérea inglesa.
Admiro a sua energia, inteligência e astúcia e pelo que sei os seus fans fizeram uma petição à Rainha Elizabeth II que o condecore ao título de Sir, veremos se sua Majestade se inclina para o caso.
Indiscutível para mim não assistir a um concerto desta banda mitica, visto-me a preceito e gosto de me envolver no ambiente aparentemente pesado mas de boas gentes, a cumplicidade e adrenalina que se sente, as emoções naqueles acordes sonoros mais famosos, os saltos a dar tudo, a descoberta de temas, a exuberante cenografia em palco, a união dos músicos, a entrega ao público, a presença animalesca e feroz de Bruce, são momentos que me enchem a alma, que me carregam de energia boa, me dão liberdade e certezas.
Estavamos de saída para Lisboa, com bilhetes comprados havia dois anos e meio, sugiro ao Duarte que viesse ao concerto mesmo sabendo de antemão que ia receber um redondo não, evitei implorar mas dei-lhe bons fundamentos de que seria uma experiência e oportunidade incriveis e isto fez com que andasse pela casa de um lado para o outro a fazer-se forte a não ceder. Não insisti. Cedeu. Compramos o bilhete. Seguimos viagem. Ao contrário dos meus pais, íamos eufóricos por ele ir e não era por ir conosco, era pela experiência que ia ter.
Quando chegámos já levava um trunfo na manga de se encontrar com umas amigas, uma delas famosa youtuber com uns bons milhares de subscritores mas só nos disse na viagem de regresso, ora gaita, nem uma foto fizémos para a posteridade.
O que sei é que as gerações mudaram e por tal as preocupações dos pais pelos filhos têm de ser diferentes das que tiveram por nós e afinal ir a um mega concerto mesmo que seja de onda pesada é basico, é como beber um copo de água, talvez até melhor, depende da sede.
Acreditemos neles, ninguém nem nenhuma geração é pior ou melhor, é a sua e vivem-na de acordo com as condições que foram criadas, agora, desculpem lá, mas não consigo imaginar a minha mãe pedir-me para ir com ela ver um concerto de Iron Maiden! Mas imagino que a Queen Elizabeth II ainda se curve à majestade Dickinson!