Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

A Sorte da Raposa

Partilha de emoções, experiências, reflexões ❤

A Sorte da Raposa

Partilha de emoções, experiências, reflexões ❤

Os sonhos são para realizar

02.07.20, Dulce Ruano

 

COROAS RAINHA.jpg

Desde que me lembro de ser gente, e ainda me recordo do casamento dos meus tios em que eu era a menina das alianças e as perdi a caminho da igreja, lembro-me também quem eram os padrinhos do meu tio e também me lembro que não levaram os filhos e por isso não brinquei com eles, pelo que, sabendo que tinha os meus 4 anitos, devo ser gente desde aí.

Mas voltando à constatação da minha memória, lembro-me de toda a minha vida ser uma sonhadora, dos muitos sonhos criativos havia muitos que não passavam de pensamentos que mais cedo ou mais tarde percebia que não passavam de uma pequena fantasia de miúda, como ter um tigre da Malásia e passeá-lo, como atacar um assaltante com um simples pau na zona lombar e ele achando que era uma pistola e ficar com as pernas a tremer desistindo do assalto, acreditar na transformação do meu corpo na super mulher, enfim, imensos, muitos mesmo.

 

Depois havia os sonhos que foram ficando nas minhas ideias e que sempre dizia que mais dia menos dia os havia de concretizar mesmo tendo a minha mãe a aconselhar-me que os sonhos não passavam disso e que tanta vez na minha adolescência me fez desacreditar dos meus sonhos, ainda assim a minha rebeldia impôs-se e não lhe obedeci continuando a sonhar e a guardar alguns em especial, ou melhor, especiais eram todos mas fui tendo noção dos que eram óbvios de realizar ou não, claro está que nunca o meu corpo físico se podia transformar na Super mulher e ficar com os super poderes dela, ficava sim era cheia de tonturas de tanto dar à roda para que a mudança acontecesse, achando eu que Linda Carter sofria verdadeiramente essa transformação, fui assim tendo consciência dos sonhos possíveis e os não concretizáveis.

SUPER MULHER.jpg

Cresci e continuo a sonhar, a colocar objectivos na minha vida, apesar de ter contrariado a minha mãe, que nada me arrependo, sei que ela agora concorda comigo. Não me importo de esperar o tempo necessário para se realizarem, sei que a oportunidade um dia chega e é quando menos se espera e, verdade que até sabe melhor, tipo de um efeito surpresa.

 

Quando era uma miudita, não é que não seja ainda, mas uma miudita adivinha-se mais ou menos o tamanho de gente, que admirava a imponência dos camiões TIR, um dia passou-me pela cabeça que tinha de viajar num camião, bastava uma única viagem e o desejo ficava realizado mas tinha um problema, não conhecia ninguém que tivesse um camião.

 

Uma vez, no autocarro de regresso a casa depois da escola, vinha na palheta com o motorista, Sr. Luis que era um senhor de se lhe tirar o chapéu, simpático, amável, bem disposto e um amigo de toda a gente que viajava nos autocarros de carreiras ditas habituais, naquela época havia um motorista único e toda a gente o conhecia, no meio da conversa que já nem sei de que é que falávamos revelei-lhe o pequeno sonho de viajar num camião TIR ao que ele me disse que me iria ajudar a realizar esse sonho.

 

Naquele dia fiquei impressionada, como seria possível o Sr. Luis me ajudar a concretizar um sonho, aguardei e poucos dias depois quando entro para o autocarro diz-me que já tinha solução para o que eu queria, os meus olhos brilharam, diz-me que o irmão dele era motorista de camiões e que era só combinar com ele o dia que eu quisesse ir numa viagem.

 

Fiquei maravilhada, parecia até que estava a viver um sonho dentro de outro sonho enquanto dormia. Poucos dias depois marcámos o encontro, tinha umas entregas para fazer em Viana do Castelo e eu tinha um amigo lá que aproveitei para visitar e passar uns dias.

 

Marcámos encontro na via rápida que passava um pouco abaixo da minha casa às 5h da manhã, ainda era de noite e eu não conhecia o irmão do Sr. Luis, fiquei fascinada quando vi o camião a aproximar-se, a fazer o pisca e parar para mim, era tão grande, parecia um comboio de uma única carruagem, estava entusiasmadíssima e nem me preocupou minimamente como seria e quem seria o irmão do Sr. Luis, tinha tempo de o conhecer, a viagem duraria umas horas.

 

Lembro-me da emoção que senti ao abrir aquela porta, subir uma escadaria enorme e entrar na cabine, caíram-me umas lágrimas, confesso. Cumprimentei o senhor e percebi logo que não ficava atrás do Sr. Luis em simpatia e cordialidade, foi mesmo impecável, respeitador e sempre atento se eu estava bem, e estava, fui mesmo bem, estava tão feliz.

 

Foi parando em alguns lugares para fazer entregas de mercadorias perguntava-me se queria comer ou beber mas não aceitei, não é que não me apetecesse mas eu não queria era sair do camião, aproveitei todos os segundos e só saí quando chegamos a Viana, despedi-me dele, agradeci e desejei-lhe boa viagem, sentia-me nas nuvens e as minhas pernas ainda tremiam de emocionada, tinha o sonho concretizado.

 

Os meus pais nunca souberam de nada, eu já era crescida e responsável pelos meus actos mas sabia que não iam compreender a realização do meu sonho e por tal disse-lhes para onde ia mas que iria no autocarro, desta forma não interferiram.

 

Passados todos estes anos, muitos, recentemente estávamos num velório de uma tia da minha mãe, daqueles momentos que se encontram famílias, parentes e amigos e conhecidos, qual o meu espanto que vejo o Sr. Luis e a Familia que por acaso tinham uma afinidade familiar da defunta, não o reconhecia mas ele aproximou-se de mim e da minha mãe para nos cumprimentar, quando ele explicou quem era, dei-lhe um abraço de saudades do tempo dos autocarros, mereceu aquele abraço, um senhor fantástico, após o cumprimento diz-me: “Então e aquela viagem de camião TIR, ainda te lembras?

Fiz um sorriso rasgado, é como que senti a adrenalina de quando subi aquela escadaria da cabine, caiu-me uma lágrima emocionada e agradeci-lhe por me ter ajudado a concretizar o sonho de viajar num camião TIR, ao mesmo tempo percebi que a  minha mãe franzia a testa e aí me topei que ela me estava a descobrir uma casaca dizendo “viagem de camião TIR? Mas que viagem foi essa, não sei de nada?”, senti-me constrangida, arregalei os olhos e disse, “Ohhh deixa lá já passou”. Nesse exato momento percebi o aperto no coração de mãe, percebi o quanto perigoso e arriscado foi entrar para um camião TIR às 5h da manhã à beira de uma via rápida com um motorista que eu nunca tinha visto, percebi naquele instante porque sou mãe e não conseguiria imaginar isto num filho meu! Claro que não é o fim do mundo mas ficaria de coração apertado, quem é mãe compreende melhor.

Que inconsciência a minha na altura, derivada da cegueira que se sobrepôs ao meu sonho, correu bem, sim, fui uma sortuda, reconheci que podia ter corrido mal.

 

Quando se quer muito tudo é possível de alcançar, o nosso desejo comanda o alcance, não desistirei dos meus sonhos mesmo quando alguém me diga que não é possível eu digo “sim, é possível” e também não vale a pena me dizerem “Ah porque já não tens idade para isso” classifico como uma desculpa sem fundamento e isso faz com que faça as coisas mais incríveis que se possa imaginar, cada vez mais me apetece ser assim e ser assim é sinal de liberdade, e tão grata que sou pela liberdade que tenho, não me foi dada, foi conquistada porque também a liberdade era um sonho que eu trazia na manga! 

DESCONFIA.jpg

Li esta frase algures:

"Os milagres começam a acontecer quando entregas a mesma energia aos teus sonhos como entregas os teus medos"

2 comentários

Comentar post