Só fui comprar velas
Encontrava-me no corredor das prateleiras das velas numa loja onde se vende de tudo, ou quase tudo.
Acabara-se-me o stock e tinha uma cliente para atender, sabia que ela ia gostar da sala de massagens repleta de velas por todo o lado e como gosto de clientes satisfeitos esmerei-me por conseguir o melhor ambiente.
Enquanto decidia por umas cores novas e diferentes aromas surge um senhor já com uma idade avançada, pede-me ajuda para lhe localizar um creme, disse-lhe que não seria ali mas ele trazia a informação de que aquele produto estava no seguimento do corredor das velas. De facto estava, mais ao fundo havia uma secção de cremes, trazia uma bisnaga vazia para servir de modelo mas naquela prateleira só havia para as mãos, ele queria para os pés.
Reparei que na prateleira atrás de mim havia mais cremes mas também só de mãos, insisti na procura e encontrei um para pés, era o último e a marca era diferente da que o senhor trazia como modelo. Apesar de ser o único que havia mas como não era igual ficou com ar de dúvida, disse-lhe que eu própria conhecia e usava aquela marca pelo que na minha opinião poderia levar com confiança. Notei que ficou mais tranquilo.
Por estar mais descansado acabou por me dizer que trazia dores nos pés, perguntei se seriam calos, disse que não e que às vezes as dores vêm para a parte de cima do pé. Perguntei-lhe se não seria por problemas na coluna e que poderiam interferir nos membros, o senhor olha para mim e diz-me “A menina havia de ser médica!” achei tão estranho, eu médica, porquê? Ele responde “Os médicos nunca me disseram isso e olhe que sofro bastante dos ossos, estou cheio de artroses” respondi que de facto não sou médica mas sou massagista e o melhor seria voltar ao médico, mas se eu pudesse ser útil me poderia contatar e deixei-lhe um cartão de contato.
Foi-se embora, antes agradeceu pela ajuda e pelo momento que ali passámos juntos, também fiquei satisfeita e só mais tarde me dei conta o quanto deve ser milagroso o creme para os pés uma vez que o procurava para alivio das suas dores.
Voltei para a zona das velas, juntei mais umas caixas às que já tinha, paguei e saí da loja.
Quando cheguei ao carro fiquei a pensar naquele homem, quando encontrei o creme dos pés é que lhe olhei para o rosto diretamente. Reconheci-o. Desde criança que o conheço e me lembro dos rumores e cuscuvelhices dos adultos sobre um momento romântico que o senhor teve com Maria do Rosário quando eram os dois uns jovens e de cujo encontro nasceu um belissimo rapaz de olhos azuis e cabelos encaracolados, foi registado com pai desconhecido, até hoje nunca se confirmou nada.
De certa forma este encontro fez-me pensar mais uma vez nas voltas que a vida dá provocando em mim alguma nostalgia e regresso ao passado de quando íamos visitar a Maria do Rosário e os meus olhos de criança viam nela um ser bonito duma bondade e simplicidade ímpares dando-me agora vontade de a procurar, dar-lhe um grande abraço e chorar de emoção e felicidade por estar com ela. A querida Maria do Rosário.